Jango

30 out 2012 . 13:08

jango

Jango refaz a trajetória política do 24° presidente brasileiro, deposto pelo golpe militar nas primeiras horas de 1º de abril de 1964. O documentário captura a efervescência da política brasileira durante a década de 1960 e narra exaustivamente os detalhes do golpe.

Jango
Sílvio Tendler
Brasil, 1984

Narração: José Wilker

Por Carolina Maria Ruy

Primeiramente deve-se levar em conta que se trata de um filme de 1984. Ou seja, do último ano da ditadura militar. Nesses 28 anos muita coisa foi descoberta. Mais ainda, descobriu-se que há ainda muito a descobrir, mais do que se pensava.

O filme relata a vida politica de João Belchior Marques Goulart. Gaúcho de São Borja, Rio Grande do Sul, nascido em 1º de março de 1919, filho de um estancieiro e coronel da Guarda Nacional e de uma dona-de-casa, Jango, como era conhecido, ingressou na carreira política em 1945, por influência de um ilustre amigo da família: Getúlio Vargas.

Dali para que ele se tornasse Ministro do Trabalho de Getúlio Vargas foram oito anos. De orientação progressista, o nome de Goulart no ministério ajudava Vargas a lidar com os trabalhadores que, ao lado da classe média e da União Democrática Nacional (UDN) faziam forte oposição ao governo.

Mas, como ministro Jango tomaria uma medida radical que o afastaria do cargo: em janeiro de 1954, planejando um aumento no salário mínimo, enfrentou de um lado a pressão dos trabalhadores por um reajuste de 100% e, por outro, a rejeição dos empresários. Como o desfecho foram os 100% pleiteados pela classe trabalhadora Jango sofreu uma forte reação dos empresários e da imprensa o que o levou a renunciar ao cargo.

Em 1955 Goulart foi eleito vice-presidente do Brasil, na chapa PTB/PSD, tendo obtido mais votos que o presidente eleito, Juscelino Kubitschek. Naquela época, as votações para presidente e vice eram separadas.

Na eleição de 1960 ele foi novamente eleito vice-presidente, concorrendo pela chapa de oposição a de Jânio Quadros, que venceu o pleito. Seu posto de vice duraria pouco. Em 1961, em plena guerra fria, Jango assumiu uma postura mais diplomática que os Estados Unidos da América gostariam de admitir. O fato de ele ser recebido pelo presidente John Kennedy, não o impedia de fazer visitas à China e à União Soviéticas. E ele fez.

Só que o Brasil não esperava que o excêntrico Jânio Quadros, pouco tempo depois de assumir a presidência, renunciasse ao cargo. Ele também fez.
A renúncia de Jânio, em agosto de 1961, abriu uma das maiores crises políticas de nossa história.

Embora a Constituição fosse clara em apontar que o vice-presidente deveria assumir o governo, os ministros militares se opuseram à posse de Jango.
Para o militares Jango encarnava a ameaça comunista ao país.

Foi aí que, liderada por Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul, começou a Campanha da Legalidade. Brizola e o general Machado Lopes, comandante do III Exército, mobilizaram o estado e usaram uma cadeia de mais de cem emissoras de rádio para conclamar o povo a sair às ruas em defesa daquilo que estava previsto na Constituição: a posse de Jango.

Antes de voltar ao Brasil, Jango, que naquele momento estava na China, aguardou em Montevidéu (Uruguai), a solução da crise político-militar. A solução foi a adoção do parlamentarismo, com parte do poder presidencial deslocada para um primeiro-ministro. Desta forma Jango assumiu a presidência em 8 de setembro de 1961, sendo Tancredo Neves, seu primeiro-ministro.
Desde o início Jango teve uma atuação peculiar. Sua inclinação progressista acirrava a efervescência política e cultural vivida no Brasil nos primeiros anos da década de 1960.

Seu famoso Comício da Central do Brasil, no dia 13 de março de 1964, em frente ao Edifício Central do Brasil, reuniu cerca de 150 mil pessoas, incluindo sindicalistas e estudantes. Naquela ocasião o presidente anunciou uma série de medidas, que estavam no embrião das reformas de base.

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Época de extremos, se por um lado os movimentos sociais e os partidos de esquerda se fortaleciam, por outro, a direita se organizava, preparando suas armadilhas. Exemplo disso foi a ultraconservadora Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 19 de março, São Paulo, que visava mobilizar a opinião pública contra o governo de Jango.

Uma das mais decisivas passagens daquela época, a revolta dos marinheiros e fuzileiros navais no Rio, em 28 de março de 1964, ilustra o que foram aqueles anos. Insuflados pelo filme soviético O Encouraçado Potemkin, de Serguei Eisenstein (1925), aqueles trabalhadores lutaram contra os baixos salários e as más condições de trabalho, transformando tais reivindicações trabalhistas em um autêntico ato político. A assembleia foi chefiada por José Anselmo dos Santos, mais conhecido como Cabo Anselmo, apontado, tempos depois, como agente infiltrado das forças de repressão.

O fato de Goulart ter se recusado a punir os insubmissos, provocou a indignação dos oficiais da Marinha.

Em 30 de março, em discurso proferido na festa promovida pela Associação dos Sargentos e Suboficiais da Polícia Militar, no Automóvel Clube do Brasil, Jango denunciou a existência de uma forte campanha contra seu governo.

Isso era um fato concreto. Na madrugada do dia seguinte o general Olímpio Mourão Filho iniciou a movimentação de tropas de Juiz de Fora (Minas Gerais), em direção ao Rio de Janeiro. Foi o início do golpe que derrubou o governo de João Goulart. Leonel Brizola ainda sugeriu que Jango resistisse, mas ele não acatou, para evitar “derramamento de sangue” (uma guerra civil). João Goulart teve seus direitos políticos cassados após a publicação do Ato Institucional Número Um (AI-1). Exilado no Uruguai e mais tarde na Argentina, onde veio a falecer em 1976, Jango só voltou para o Brasil em seu funeral. Aclamado pelo povo, seu caixão foi carregado por milhares de pessoas já cansadas do regime repressivo submisso ao FMI dos ditadores.

O filme relata, através de depoimentos e de documentos históricos, como vídeos, áudios e fotos, as atrocidades cometidas pela ditadura até o ano de 1976. Com as informações que poderiam ser obtidas naquela época, o filme é um primoroso e melancólico documento sobre a história do Brasil. Mas o tempo nos mostrou que a ditadura militar, além de anos de chumbo, representou anos de segredos de estado. Ainda há muito o que se revelar sobre esta história.

 


 

Carolina Maria Ruy é jornalista, coordenadora de projetos do Centro de Memória Sindical

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