09 jan 2016 . 12:03
Despedimo-nos do terceiro mandato na direção técnica do DIEESE. Valeu a pena? Penso que o critério para a resposta está em outra pergunta: desenvolvemos vitalidade institucional para criar respostas aos desafios?
NO INFERNO
Vamos começar pelo mais difícil pois, neste mandato, experimentamos uma descida ao inferno. Foi uma experiência inédita e dramática! Verdadeiramente insana!
Em meados de agostos de 2011, céu de brigadeiro, fizemos o balanço da nossa gestão, identificando os desafios a partir da visão de futuro que tínhamos, naquele momento, para o Dieese. Em síntese, percebíamos, que deveríamos ampliar nossa presença sindical (crescer com o movimento sindical) e alterar ainda mais a estratégia de projetos extrassindicais, leia-se: eliminar a dependência do orçamento corrente dessa fonte de financiamento e aprofundar seu uso para investimento, desenvolvimento e formação. Montamos uma estratégia que compreendia: (a) usar o superávit orçamentário estimado para 2011 e 2012 (b) e mobilizar o movimento sindical para (c) constituir Fundos Financeiros capazes de (d) gerar estabilidade no financiamento do DIEESE; (e) adequar nossa organização administrativa para (f) responder com maior segurança à nova complexidade institucional do DIEESE; (g) ampliar, em todas as áreas, nossa presença sindical. Debatemos no Fórum de Supervisores e na Direção Sindical, naquele ano, essa estratégia, aprovando-a.
Em outubro de 2011 nos levaram ao inferno. A crise política na relação entre o governo federal e as organizações sem fins lucrativos nos atingiu de maneira dramática ao travar todos os convênios e contratos com o setor público federal. Saímos de uma execução orçamentária superavitária para um déficit de R$ 3 milhões naquele ano. Tivemos que, em dois meses, “achar” ou “cortar” esse montante para fechar o orçamento do ano. Foi, mais uma vez, na vida institucional, um grande teste de resiliência.
Aquilo que fora um vetor importante para superar a crise de 2003 – fontes extrassindicais -, transformara-se em um grande problema.
Identificávamos, no cenário desenhado antes da crise, uma tendência de médio prazo de redução da capacidade de realizar superávit em convênios com setor público. Já vínhamos atuando com (a) diversificação de fontes públicas, (b) celebração de contratos onde coubesse e (c) investindo na qualificação da equipe para gestão mais complexa de projetos. Essa estratégia compreendia que o DIEESE capta recurso publico para fazer investimentos no desenvolvimento de trabalhos de interesse sindical e de relevância pública, que deve financiar o custo de sua execução com uma gestão adequada à natureza da fonte de financiamento. A reorganização administrativa deveria melhorar a capacidade de gerir esse tipo de contrato e fonte de financiamento. Superávits orçamentários deveriam lastrear fundos de financiamento e estabilidade financeira.
Veio a crise e, em segundos, tudo ficara turvo e parecia desmoronar! O desespero bate à porta com força. O medo, a insegurança, a ansiedade são adversários a serem enfrentados nessas horas. Bem, redesenhamos os cenários possíveis e deslocamos toda nossa atenção para a atuação de curto prazo, conseguindo fechar o ano de 2011 com todas as contas quitadas. Optamos – decisão de alto risco que testava a credibilidade acumulada – por “achar” os R$ 3 milhões junto ao sócios. O movimento sindical entendeu o problema, apoiou-nos e aportou recursos suficientes para encerrarmos o ano. Talvez nem todos tenham consciência da gravidade e extensão da crise, bem como na qualidade da resposta sindical realizada.
Reduzimos, também, despesas administrativas e, especialmente, o custo da equipe com os seguintes procedimentos: (a) realocando equipe do escritório nacional para subseções; (b) não substituímos aqueles que pediram para sair; (c) evitamos contratações previstas e necessárias. No primeiro ano cortamos R$ 1 milhão. Debilitamos, com isso, nossa capacidade de gestão.
O tempo nessas horas “passa rápido demais, sô!” e, 2012 foi revelando que o pior cenário desenhado transformava-se na nossa melhor perspectiva. Cortamos outro R$ 1 milhão com as mesas ações e buscamos receitas para fechar o orçamento. Em um esforço muito, mas muito grande mesmo, fechamos o ano. As consequências para a gestão foram e ainda são dramáticas.
No balanço de 2012 estimamos que conseguimos destravar 1/3 daquilo que imaginávamos poder resolver ao longo do ano quando desenhamos nosso cenário realista. A crise levou a Direção Executiva à encaminhar a prorrogação do mandato da atual Direção Técnica para continuar tratando da crise.
Começamos 2013 com um Orçamento deficitário em 1/3 das despesas previstas (aquelas já ajustadas), ou o equivalente a R$ 10 milhões em termos de necessidade de financiamento. Hoje, continuamos lutando para fechar esse orçamento, mas já conseguimos reduzir a necessidade de financiamento para R$ 3 milhões.
Há em curso um conjunto de ações que visam reorganizar ou reposicionar os convênios e contratos e buscam fortalecer nossa presença sindical. Porém, com os cortes feitos no escritório nacional, temos limitadíssimas capacidades de operar tudo que deveria e precisa ser realizado. Há muita coisa que estamos deixando de fazer, especialmente no que concerne à gestão da equipe e na articulação da produção técnica.
Lutamos, essa é a minha sensação, para construir escadas para sair desse inferno! O problema são as atividades sísmicas que insistem em destruir, a cada tempo, parte dos degraus que, com muito esforço, construímos. É preciso, a todo tempo, levantar-se e voltar à construir! Sem essa persistência e teimosia não sairemos desse inferno. Não há, é verdade, uma única saída. É preciso preparar (ou estar preparado) para algumas possibilidades, mas sabendo que devemos viabilizar, nas escolhas do dia-a-dia, o melhor caminho.
Aqui, na solidão intrínseca à atividade de direção, cabe achar energia para fortalecer quem quer desistir, esclarecer quem acha que as coisas não são bem assim, paciência diante daqueles que acreditam que “as coisas não são bem assim”, ou aqueles que diante do que declaramos, pensam, “ah! eles sempre acham saída” ou, ainda, que é dever da direção resolver o problema.
É, sem duvida, dever da direção enfrentar o problema. Resolvê-lo, já é um atributo do resultado, no qual, o fracasso é sempre uma possibilidade, ainda mais quando muitos dos fatores que para ele concorrem não estão sob nosso controle.
Entendendo que a vida é assim mesmo. O que é importante é não perder a capacidade de testar a hipótese, algumas vezes ocultas nessa formulações, de que a direção está, ou pode estar, errada. No ato de dirigir não podemos deixar de enfrentar essa questão – a possibilidade do erro, para poder minimizar sua ocorrência -, ponderar e decidir. Fazemos isso o tempo todo: decidimos!
Creio, em primeiro lugar, que terminamos essa gestão enfrentando bem a crise, mas ainda estamos longe de tê-la resolvido. Esse é um desafio que fica.
Em segundo lugar, é fundamental reorganizar administrativamente o DIEESE para uma gestão mais complexa de convênios e contratos com o setor público, bem como construir novas formas de estabelecer a regularidade dessas fontes para a consecução das atividades que devem ser financiadas por esse tipo de recurso.
Em terceiro lugar, recuperar a capacidade de gestão da equipe, do processo de produção coletiva, de investimento da formação da equipe, entre outros desafios urgentes.
Em quarto lugar, promover a instituição de fundos de estabilidade para o financiamento.
O QUE DEU ALEGRIA! Ou, o que fizemos nesses três últimos anos.
Sem alegria (estado para criar) e atenção (estado para ponderar) não se enfrentam os desafios. Energia para levantar-se todo dia com vontade para enfrentar nossos problemas. O que dá energia é a quantidade e a qualidade da resposta que construímos coletivamente – muitas vezes em um trabalho quase solitário, mas sabendo que estamos juntos, mesmo na distância.
Uma crise como essa que enfrentamos poderia nos ter paralisado. Poderia! Mas não paralisou! Fizemos muitas coisas bacanas, concretizando muitas diretrizes do nosso projetos trienal. Vejamos algumas dessas coisas que estão na minha memória.
Quem somos hoje?
Somos uma equipe de 293 trabalhadores, 188 na área técnica, 55 administrativos, 29 na área de pesquisa, 12 na escola, sendo 7 professores, 3 estagiários e 5 menores aprendizes (exigido pela Lei).
Temos uma sede nacional, 18 sedes regionais, 58 subseções, 7 unidades de pesquisa da PED, 10 Observatórios do Trabalho. Isso totaliza mais de 90 unidades de trabalho dispersa no território nacional.
Bem, o tempo para escrever acabou. A memória apresenta sinais de … de …..de
Sei que esqueci muita coisa. Desculpem-me!
Quero, antes de encerrar, em nome de toda direção técnica, agradecer:
À direção sindical, em nome dos nossos presidentes nesses três anos e meio – Josinaldo (Cabeça), Zenaide e Antônio (Padre), pela confiança, cooperação, apoio e paciência diante das nossas limitações.
À equipe pela oportunidade de podermos trabalhar juntos, pelas respostas diante dos desafios, pela presteza diante das urgências, pela serenidade diante das tragédias e, principalmente, pela qualidade do trabalho técnico e compromisso com a vida sindical e a luta dos trabalhadores.
Por fim, gostaria de lembrar que nosso próximo Projeto Trienal nos levará aos 60 anos. É hora de reunir, cimentar compromissos, fortalecer utopias para ampliar a capacidade desse patrimônio criado pelo movimento sindical à serviço dos trabalhadores, produzir conhecimento para a intervenção na realidade.
Muito obrigado a todos pela vitalidade que, juntos, fomos capazes de desenvolver.
Meu sincero sentimento é de que
Valeu a pena!
Abraço
Clemente Ganz Lúcio
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