Aquele movimento deu ânimo ao III Congresso do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, de onde saíram as principais reivindicações da campanha salarial de 1979. O Congresso, realizado entre 6 e 16 de outubro de 1978, no Guarujá (litoral de São Paulo), debateu a autonomia e liberdade sindical, unidade e pluralidade sindical, contrato e convenção coletiva, eleições sindicais, receita e despesa e contribuição sindical. Depois dele o Sindicato passou a realizar reuniões de operários por empresas.
1979: novas reivindicações
No final de janeiro de 1979, os metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema estabeleceram suas reivindicações para a campanha salarial que começou em fevereiro: 34,1% de aumento real; piso salarial igual a três salário mínimos; vigência da Convenção Coletiva de Trabalho, de abril até outubro de 1979, para que pudesse coincidir com a data-base dos metalúrgicos da capital, Osasco e Guarulhos; reconhecimento e estabilidade para os delegados sindicais e redução da jornada de trabalho para quarenta horas semanais e reajustes trimestrais. Para aquela campanha o então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, Luís Inácio Lula da Silva, teve uma ideia para aquela: convocar uma assembleia capaz de lotar um campo de futebol.
A campanha salarial ocorreu e, em assembleias realizadas nos dias 9 e 10 de março, os metalúrgicos decidiram declarar greve a partir do dia 13 daquele mês. A ideia de Lula de lotar um estádio ocorreu naquele dia, às vésperas da posse do general João Figueiredo na Presidência da República. Debaixo de chuva fina, 80 mil metalúrgicos ocuparam o gramado e as arquibancadas do estádio da Vila Euclides. Lula falou de cima de uma mesa, e suas palavras eram sucessivamente repetidas e passadas para diante, pois não havia palanque nem sistema de som.
A adesão à greve foi maciça: calcula-se que cerca de 200 mil trabalhadores cruzaram os braços em todo o processo. Eram trabalhadores da Ford, da Volkswagen, da Mercedes-Benz, da Brastemp, da Villares, da Schuler, da Vulcanus, da Motores Buffalo, da Saab-Scania, da Chrysler, da Cima, da Cofap, da Otis, da General Electric, entre outras fábricas de pequeno, médio e grande porte. O movimento também repercutiu no interior do Estado, com greves em São José dos Campos, Caçapava, Jacareí, Jundiaí, Campinas e Santa Bárbara d’Oeste.
Fundo de greve
No dia 15 de março os trabalhadores rejeitaram proposta de reajuste do TRT e reafirmaram sua decisão de levar a greve “até a vitória”, desencadeando uma campanha nacional em solidariedade aos grevistas. Um resultado desta campanha foi a criação, até então inédita no país, do Fundo de Greve, que consistia no recolhimento e distribuição de alimentos doados aos grevistas. Isso fortaleceu a resistência para longos dias de piquetes e repressões.
Intervenção
No décimo dia de greve (23/03), o Ministério do Trabalho propôs um protocolo de intenções que estabelecia a criação de uma comissão tripartite para estudar, no prazo de 45 dias, o índice de reajuste, a proibição de demissão aos grevistas e o pagamento das horas paradas a serem descontadas em parcelas. O protocolo seria levado aos trabalhadores e sua aprovação implicaria no retorno imediato ao trabalho. Mas, novamente, os operários, reunidos no Estádio de Vila Euclides, rejeitaram a proposta.
A greve foi então considerada ilegal e foi reprimida pela Polícia Militar na madrugada de 22 para 23 de março. O governo interveio nos sindicatos de metalúrgicos de Santo André, São Bernardo, e os trabalhadores passaram a se reunir na Igreja Matriz da cidade.
Trégua de 45 dias
No dia 26 de março, Lula e a diretoria do sindicato reassumiram a liderança do movimento, reafirmando a necessidade de manter a greve. Mas o movimento começou a refluir. Houve considerável retorno ao trabalho, o que fez com que a direção sindical e a comissão de salários percebessem que seria difícil manter os trabalhadores mobilizados.
Com isso, na assembleia geral do dia 27 de março, Lula e o comando de greve resolveram admitir os 45 dias, como uma trégua, nos moldes dos sindicalistas. Neste período, através de novas negociações com os patrões, tentar-se-ia obter um índice salarial satisfatório. Caso contrário, os metalúrgicos do ABC entrariam em greve novamente.
O Sindicato seguiu mobilizando os trabalhadores durante os dias de trégua. O salão paroquial da igreja matriz de São Bernardo do Campo passou a ser a sede da direção do movimento. Realizaram-se shows, torneios de futebol e várias outras atividades.
O fim da greve
Com o fim da trégua, no dia 13 de maio, foi realizada uma nova assembleia, onde o acordo, que estabelecia, entre outros itens, 63% de reajuste salarial (os trabalhadores reivindicavam 65%) foi apresentado aos trabalhadores. Naquele impasse, e devido à extensão da greve, o acordo foi aprovado e a greve, encerrada. Além disso, recuperar o Sindicato, que estava sob intervenção, era uma prioridade naquele momento. Mas os patrões não cumpriram o prometido e realizaram demissões e descontos nos salários dos trabalhadores grevistas.
Apesar da aprovação por maioria absoluta dos presentes, boa parte dos trabalhadores saiu insatisfeita daquela derradeira assembleia. Para eles, diferentemente da avaliação das lideranças, o movimento deveria continuar com a retomada da greve.
Setores oposicionistas à diretoria do Sindicato, ligados a correntes políticas, passaram a utilizar o descontentamento gerado com o fim do movimento para desgastar a Diretoria afastada. Isto fez com que os diretores, ao retornar, convocassem uma nova assembleia, onde seus mandatos foram colocados à disposição para que os presentes decidissem se deveria ou não retornar à direção do Sindicato. Os trabalhadores aprovaram a retomada oficial da direção do Sindicato, por unanimidade. No dia 18 de maio, o Sindicato foi devolvido aos trabalhadores.
Carolina Maria Ruy é coordenadora do Centro de Memória Sindical
Fontes: ABC de Lutas, Folha de SP, Portal Vermelho