14 mar 2016 . 15:26
Luiz Antônio de Medeiros é metalúrgico, fundador e presidente da Força Sindical de 1991 até 1999. Foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Deixou a Presidência da Força Sindical para ser deputado federal por São Paulo durante dois mandatos.
Leia aqui a entrevista em inglês
Entrevista realizada em 14 de abril de 2011
Criação da Força Sindical
A partir de 1987, quando ganhamos as eleições para a Presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo (1), nosso grupo modernizou a entidade. Criamos cinco subsedes, equipamos com carros e organizamos os trabalhadores nas fábricas como delegados sindicais, entre outras coisas. Com isto, o Sindicato passou a se tornar conhecido, a ser uma referência, o que nos aproximou dos trabalhadores. Os Metalúrgicos, por exemplo, foram os primeiros a reduzir a jornada de 48 horas para 44 horas remuneradas (2). Também foram os que mais cresceram na garantia da proteção aos acidentados e à mulher trabalhadora.
Mas, em nível nacional, a grande maioria dos Sindicatos não participava muito. Além disso, a CUT estava em formação. Era uma central combativa, mas de muito controle. Os grandes debates da CUT não resultavam em acordos salariais. Eles esticavam a corda até ela arrebentar, gerando muitas demissões.
Haviam dois grandes Sindicatos de Metalúrgicos: o de São Paulo e o de São Bernardo do Campo. Tínhamos 500 mil pessoas nos Metalúrgicos. O sonho da CUT era ter esse Sindicato, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, porque era o maior. Se eles ganhassem o Sindicato de São Paulo, seria uma central única. E esse negócio de ser único já é uma oposição à ideia de pluralidade, e pluralidade democrática.
Não dava para nós (do Sindicato) nos rendermos aos radicais, que queriam fazer um Sindicato construindo outros objetivos. Por outro lado, também não queríamos ser identificados com aquele sindicalismo apático, pelego e atrasado que se limitava a administrar o arrocho salarial.
Então concluímos que esse negócio de único não dava. Tinha que ser democrático. Em uma fábrica, tem gente que é socialista, outros são comunistas, tem gente de direita, de esquerda, católico, protestante, e a cúpula também tem que refletir sobre isso. No Sindicato temos de ter as várias visões dos trabalhadores. Por que a cúpula tem de ser única?
Nos opusemos à ideia de central única e criamos a nossa própria organização. Criamos esta organização com o objetivo de lutar, mas também de buscar a negociação, pois achávamos que, em primeiro lugar, era preciso negociar à exaustão. Partimos do princípio que, mesmo tendo muitas divergências, em um determinado momento tem de haver a convergência entre patrão e empregado.
Lembro de dois sindicalistas muito importantes, junto com os quais, no final de 1990, decidi criar a Força Sindical: o (Melquíades) Araújo, que era (e ainda é) presidente da Federação da Alimentação, e o Lucânia (3), da Federação dos Comerciários. Éramos representantes de três grandes categorias: metalúrgicos, comerciários e alimentação. Trabalhávamos como um núcleo, e cada um levou a proposta para as suas categorias. Queríamos formar uma central Sindical que não fosse nem radical e nem imobilista.
Esta força sindical nacional deveria participar das lutas gerais, procurando representar o trabalhador nas grandes questões nacionais e tendo como sua flor do dia o combate com negociação.
Criamos, então, uma fortaleza inexpugnável. Participamos de eleições pelo Brasil. Em Volta Redonda, por exemplo, que era um Sindicato da CUT, nós fomos lá e ganhamos.
Sempre tivemos um programa afirmativo de lutas, propostas e projetos. E tivemos a coragem de, desde o início, botar a cara para bater e garantir a nossa independência, o que não era muito a característica do sindicalismo daquela época. Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, abrimos um grande processo pela reposição das perdas de mais de 40% do Fundo de Garantia no governo Collor. E quem abriu esse processo fui eu, no Sindicato dos Metalúrgicos. É um bom exemplo de como a Força nunca perdeu a noção de independência e, hoje, é uma das maiores centrais do País.
Primeiras lutas
Naquela época, meados dos anos de 1990, ninguém se incomodava em negociar a tabela do imposto de renda. Mas nós fomos lá e negociamos esta questão com o Marcílio Marques Moreira. Além disso, houve a questão da PLR (Participação nos Lucros ou Resultados). A Força Sindical lutou pela participação dos trabalhadores nos lucros da empresas. A correção dos aposentados também foi por nosso intermédio. Abrimos processos nacionais em um momento em que ninguém abria. São lutas e negociações em que fomos pioneiros.
Transformações ao longo do tempo
A Força Sindical manteve a sua independência em relação aos governos. Apesar de atuar no governo Lula, na negociação do salário mínimo, atuamos com independência. Não se pode fazer sindicalismo se não há independência do empresário, dos partidos, dos governos. Mas hoje há muita confluência Não existe mais radicalismo revolucionário. Não existe mais essa coisa de vou acabar com o sistema de produção, de mercado. Defendemos mercado com forte regulamentação. Mas, não há mais um setor que queira pegar o Sindicato como alavanca para fazer revolução, como havia antes.
Acho que as centrais estão cumprindo o seu papel, mas também acho que os Sindicatos podem fazer ainda mais do que fazem. Os Sindicatos têm de ser mais combativos agora que estamos em um momento de crescimento econômico. E, em momentos como este, é necessário usar determinadas táticas para tirar mais proveito para o trabalhador. Por exemplo, quando tinha a Monark (fabricante brasileira de bicicletas) e a Caloi (fabricante brasileira de bicicletas e equipamentos), parávamos uma e deixávamos a outra trabalhando. Não tinha jeito de os empresários mandarem os trabalhadores embora. O que eu quero dizer é que devemos usar muito mais essa atuação por setores, por regiões, por fábrica, para tirar aquilo que não se consegue em um acordo geral. Precisávamos dar uma chacoalhada na realidade sindical.
Unidade entre as centrais
Acredito que a unidade entre as centrais é possível e muito positiva. Não tem porque dividir o movimento sindical em bandeiras como a redução da jornada de trabalho. Todo mundo deve estar junto e negociar. Não se sai de uma jornada de 44 para 40 horas de um momento para outro. Quando conquistamos 44 horas semanais, na Constituição de 1988, o processo se deu reduzindo uma hora por semestre, até passarmos de 48 para 44 horas semanais. Agora é possível passar de 44 para 40 também paulatinamente. As centrais tinham de chegar a esse acordo. Acho que é importante a demonstração de força, o 1o de Maio, com dois ou três milhões de pessoas e todas as centrais juntas, empunhando a bandeira da redução da jornada de trabalho.
Os 20 anos da Força
Os 20 anos da Força foram percorridos por um caminho correto, com competência e responsabilidade. A bandeira principal deve ser a redução da jornada de trabalho. Mas acho que os Sindicatos brasileiros têm de resolver o problema de financiamento. Não se pode acabar com o imposto repentinamente, mas pega mal para o Brasil ainda ter esse tipo de tributo. E isso é uma chaga! A saída é negociar! A Força Sindical foi criada para alavancar os Sindicatos. Esse imposto é da época do Getúlio. Chega uma hora em que os Sindicatos precisam caminhar com suas próprias pernas. Todas as instituições que têm vida longa são aquelas que se renovam, e eu acho que essa instituição se renovou. Mas temos de buscar uma alternativa para a questão do financiamento.
Notas da redação
(1) Medeiros foi eleito para a Presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo em 1987 e 1990.
(2) Em 1985 metalúrgicos paulistas realizaram uma greve de 54 dias pelas 40 horas semanais. O movimento foi iniciado pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, e também contou com a participação do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, com adesão estimada de 290 mil trabalhadores. A greve, de 54 dias, teve como resultado a redução jornada de 48 horas semanais para 40 horas em algumas fábricas, e 44 ou 45 horas em outras. Esta luta teve forte influência para a elaboração da pauta trabalhista na Constituição de 1988, que consagrou em seu texto a jornada legal de 44 horas.
(3) Paulo Fernandes Lucânia (1940/2007) foi presidente da Federação dos Empregados no Comércio do Estado de São Paulo (Fecesp) de 1989 a 2007.
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