10 abr 2013 . 10:14
A transição do Feudalismo para o Capitalismo começou a partir do século XI. Nesse processo, o sistema de produção, bem como da vida da grande massa populacional foi se transformando de forma abrupta.
Por Ricardo Flaitt
A Árvore dos Tamancos (L´Arbero Degli Zoccoli)
Itália/França, 1978
Ermanno Olmi
Com Luigi Ornaghi, Francesca Moriggi, Omar, Brignoli, Antonio Ferrari, Teresa Bresciani, Giuseppe Brignoli.
Com as mudanças nas relações comerciais, econômicas, de poder (políticas), o mundo foi adotando novos valores e composições sociais. Com isso, as pessoas foram perdendo o contato com antigos valores.
Há que se considerar que o homem no modo de produção feudal também sofria os efeitos da exploração. No modo de produção capitalista, o homem perde a propriedade dos bens de produção, do controle do seu tempo e da sua força de trabalho.
O Sistema Capitalista, em sua velocidade, aliena o homem, afasta-o de sua natureza, como bem disse o poeta Affonso Romano de Sant´Anna, em “Carta aos Mortos”: (…) Alguns hábitos, rios e florestas / se perderam. / Ninguém mais coloca cadeiras na calçada / ou toma a fresca da tarde, / mas temos máquinas velocíssimas / que nos dispensam de pensar.
Quando não se submetiam à venda de sua força de trabalho, os trabalhadores ocupavam as terras em sistemas de parceria da produção, onde o meeiro, era uma das formas de parceria, e tinha que viver com o que recebiam da venda de parte do que produziam nas terras do Senhorio. Num sistema ainda muito impregnado do sistema de vassalagem feudal (transição).
O ápice dessas transformações/revoluções no modo de se produzir e de se viver aconteceu no século XVIII, como consequência da revolução industrial, que iniciou na Inglaterra.
Com objetivo de retratar a relação homem e o trabalho no cinema, o diretor Ermanno Olmi, em “A Árvore dos Tamancos” faz um recorte histórico, metonímico, onde enfoca a vida de famílias na região da Lombardia, norte da Itália, e suas dificuldades para sobreviver como meeiros nas terras do Senhorio.
Como forma narrativa, no roteiro também assinado por Olmi, a história apresenta fragmentos dessas famílias, formando, ao final, um grande painel de como era a vida dos trabalhadores rurais no final do século XIX.
O mosaico de Olmi é formado de histórias que se entrelaçam como o surgimento do amor entre um casal de jovens camponeses; o trabalhador idoso que pensa como fertilizar os tomates antes da época para buscar maior ganho; as diferenças entre as famílias, a disputa pela produção; e a força da religião que permeia a todos e alimenta suas almas.
O título, “A Árvore dos Tamancos” é talhado a partir da história emocionante de um casal de trabalhadores, que luta para não transferir ao filho pequeno, o legado de suas duras vidas no campo, do trabalho incessante e da falta de acesso ao conhecimento.
Porém, a vontade dos pais em ver o filho estudar esbarra nas dificuldades práticas da vida. A escola localiza-se a quilômetros da fazenda e os recursos são parcos, a ponto de terem dificuldade de comprarem sapatos ao menino.
Numa sequência emocionante e trágica, em uma dessas longas caminhadas à escola, o menino vê seu sapato de madeira rachar. O pai, então, resolve cortar uma árvore para fazer, madrugada adentro, um novo par de sapatos para que o filho não perca os estudos.
Olmi, de forma poética, ilustra os desafios do casal para encaminhar o menino aos estudos. Coloca-nos a pensar sobre a condição do acesso ao Conhecimento para a grande massa operária e o Saber como instrumento de dominação.
Contrapondo-se ao Conhecimento, o filme enfoca também o papel e o peso da religião na comunidade. Uma forma de explicar os desencontros do mundo criado pelo homem social.
A força de “A Árvore dos Tamancos” está em sua atemporalidade e universalidade. O retrato das vidas dos trabalhadores da Lombardia pode ser o retrato de milhões de trabalhadores no mundo atual.
Mudam os artefatos, as tecnologias, a exploração do homem pelo homem; porém a equalização das desigualdades ainda representam um grande desafio para sistema capitalista, que cada vez mais caminha, de forma vertiginosa, para uma vida tecnicista e alienante, como já preconizou Godard em “Alphaville”.
Música não original: Johann Sebastian Bach.
Prêmios:
– Festival de Cannes 1978 (França): Ganhou a Palma de Ouro (melhor filme) e o Prêmio Especial do Júri Ecumênico.
– BAFTA 1980 (Reino Unido): Recebeu o Flaherty Documentary Award.
– Prêmio César 1979 (França): Venceu na categoria de melhor filme estrangeiro.
– Prêmio David di Donatello 1979 (Itália): Venceu na categoria de melhor filme.
– Academia Japonesa de Cinema 1980 (Japão): Indicado na categoria de melhor filme em língua estrangeira.
– Prêmio NYFCC 1979 (New York Film Critics Circle Awards, EUA): Venceu na categoria de melhor filme em língua estrangeira.
Curiosidades:
– Todo o elenco foi formado por camponeses reais da província de Bérgamo, na Itália, e não tinham nenhuma experiência como atores.
Ricardo Flaitt, Alemão, é assessor de imprensa da Federação dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo, colaborador no Centro de Memória Sindical e estudante dos cursos de História e Gestão Pública
*Revisão crítica: Dra. Carmen Lucia Evangelho Lopes
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