14 fev 2014 . 18:55
Cabra Marcado para Morrer
Brasil, 1984
Eduardo Coutinho
Com Eduardo Coutinho, Ferreira Gullar, Tite de Lemos
O destino do líder camponês João Pedro Teixeira, assassinado em 1962, mostra que a repressão no campo já existia muito antes de 1964. Contudo, a tenacidade de sua luta se impôs ditadura adentro. O intuito de relatar sua história no cinema se desdobrou em um flagrante de realidade nua e crua revelando que o “Cabra Marcado Para Morrer” é o próprio povo brasileiro.
O semidocumental “Cabra Marcado para Morrer”, lançado em 1984, é um filme dentro de um filme.
Em fevereiro de 1964 Eduardo Coutinho iniciou seu projeto intitulado “Cabra Marcado Para Morrer”, que consistia em levar aos cinemas a história de João Pedro Teixeira, líder da liga camponesa “Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP)”, assassinado em 1962.
Para encenar o filme, o diretor convidou moradores do engenho da Galiléia da cidade de Vitória de Santo Antão, Pernambuco, ao invés de atores profissionais.
No dia 31 de março daquele ano, entretanto, o golpe militar não apenas mudaria os rumos da política e da economia brasileira, como também interviria fortemente na cultura, em seu sentido mais amplo. Sob a repressão da ditadura a filmagem de “Cabra Marcado Para Morrer” foi interrompida em 1964, sob a vaga alegação de “prática comunista”.
À exemplo de diversos outros grandes projetos culturais e políticos do Brasil, a história de João Pedro Teixeira ficou em suspenso ao longo dos vinte anos de vigência do regime. Mas Coutinho não desistiu dela e, em 1984, retomou seu trabalho sob um novo enfoque.
Ele transformou o drama real que se deu no início das filmagens, em uma rica demonstração de como o governo não apenas destruiu um movimento crescente e promissor, mas também desagregou famílias e desestruturou vidas de pessoas comuns.
A proeza do diretor foi conseguir reunir os mesmos técnicos depois de tanto tempo para procurar cada pessoa que apareceu na película. A história de cada um naquele período se tornou, desta forma, o enredo do filme. O destino do líder camponês João Pedro Teixeira, assassinado em 1962, é sinal de que a repressão no campo já existia muito antes de 1964. Contudo, a tenacidade de sua luta se impôs ditadura adentro. Coerentemente com sua ação política, a história de sua vida não se limitou a uma trajetória pessoal.
O intuito de relatar no cinema quem foi João Pedro se desdobrou em um flagrante de realidade nua e crua.
Neste sentido e naquele contexto, o “Cabra Marcado Para Morrer” é o próprio povo brasileiro.
Carolina Maria Ruy é jornalista, coordenadora de projetos do Centro de Memória Sindical
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