03 maio 2012 . 11:29
Fonte:Carolina Maria Ruy*
Das tendências mundiais dos últimos 40 anos, que reconfiguraram o mundo da produção, do dinheiro e do trabalho, o envelhecimento da população merece atenção especial.
Desde os anos de 1960 constatou-se que, em nível mundial, as pessoas passaram a ter menos filhos, ao passo que, com o aumento da longevidade, a média de óbitos também diminuiu. Como resultado desta equação tanto os países desenvolvidos como, de modo crescente, os países em desenvolvimento, passaram a contar com cada vez menos crianças e cada vez mais idosos.
Se tal situação assola o Brasil, que amargou séculos de recessão e subdesenvolvimento social, encontrando seu caminho em um passado ainda muito recente, imagine em um país com uma economia desenvolvida e estabilizada há muito tempo.
Pensemos na Noruega. Aquela nação escandinava, berço dos vikings, de clima oceânico, continental, subártico e alpino, com uma população de cerca de 5 milhões de pessoas e uma taxa de crescimento populacional de 0.7% (dado de 2005). Com uma das mais elevadas taxas de expectativas de vida do mundo, não há dúvida sobre o envelhecimenta da população norueguesa.
Aposentados em plena atividade social devem saltar aos olhos na demografia daquele país. O personagem Odd Horten (Baard Owe), 67 anos, maquinista da linha de trem de Bergen é, portanto, um norueguês comum. Através de sua história podemos sentir o ambiente de seu país, a formalidade, o agudo senso de dever, a contenção emotiva, a monotonia, a ordem que se perpetua através das gerações e um delicado e secreto anseio por aventuras e mudanças.
Odd é um funcionário metódico, que fará a sua última viagem pelas montanhas antes de se aposentar (por idade aos 67). Sua vida é previsível como o trajeto do trem que guia diariamente. Após décadas de serviços prestados, ele próprio já se assemelha fisicamente a uma locomotiva, com bigodes que parecem limpa trilhos e um cachimbo sempre soltando fumaça.
O filme nos leva, com muita sutileza, ao seu íntimo. Mas nada de grandes dramas, mesmo porque, à moda escandinava, estamos falando de uma comédia. Situações absurdas envolverão este homem, como ficar preso para fora da porta na festa de sua aposentadoria e acabar invadindo o apartamento vizinho e ali ceder às chantagens de uma criança que o quer por perto até adormecer, ou conhecer um bêbado na rua e ao prolongar amizade, descobrir as minúcias de sua vida e confortável situação financeira.
Desolado pela falta de sua antiga rotina, o café da manhã, o serviço, os colegas, a volta para casa, Odd terá de aprender a conviver com outras pessoas e coube a alguém que é o seu oposto, o outsider Trygye Sissener (Espen Skjønberg), proferir palavras inspiradoras para Odd buscar novos caminhos.
Caro Sr. Horten nos chama a atenção para a longevidade nestes novos tempos em que o espaço urbano se consagrou e a família diminuiu. Mas enfatiza a situação peculiar de um país em que a solidão é comum e a intimidade nem tanto. O fime aborda, sobretudo, o universal poder de transformação que cada um traz dentro si.
Carolina Maria Ruy é jornalista, coordenadora de projetos do Centro de Memória Sindical
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