O que você Faria? El Método

03 maio 2012 . 11:19

2005, Argentina /Espanha /Itália Marcelo Piñeyro Com Natalia Verbeke, Eduardo Noriega.

FONTE: Carolina Maria Ruy

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Existem muitos filmes interessantes que são elaborados a partir de diversas óticas, para além do nosso mote central que é o trabalho. Este caráter amplo e diversificado é próprio das artes. São expressões poéticas e simbólicas da realidade. Comumente estas idéias subjacentes à arte passam mensagens e padrões. Esta estratégia de disseminar ideologias é amplamente difundida na nossa sociedade, através, não apenas da cultura (em seu caráter mais abrangente, incluindo aí programas de entretenimento, novelas etc), mas também com o uso da poderosa máquina da propaganda.

Se a idéia que sustenta o presente debate acerca do “cinema e o mundo do trabalho”, fosse classificar os filmes que tem a vida trabalhista como mote, seria estranho incluir filmes como: Foi apenas um sonho, Moça com brinco de pérolas, 2001: Uma Odisséia no Espaço e até mesmo Jean Charles. Mas a intenção aqui é pensar em como o trabalhador se encaixa nesta sociedade. Como que o trabalhador, mola propulsora do sistema sócio-econômico dominante, é retratado nos mais diversos aspectos que a arte? O cinema, de modo geral, pode incitar uma reflexão do trabalhador sobre si mesmo, como categoria, como classe e como fenômeno social.

Assim, tal debate propõe a desconstrução do estereótipo de “classe social” como uma concepção superada. Ele chama a atenção para as novas formas com que a classe trabalhadora se apresenta na sociedade moderna.

Se a idéia fosse a de simples classificação, seria óbvio falar do filme O que você faria (ou El Método). É fácil imaginá-lo material didático em faculdades que formam empresários, ou em dinâmica de grupo que selecionam empresários.

O filme apresenta o universo (asséptico e fechado) empresarial. Então, ele estaria com passe livre para esta lista. Mas nossa intenção é refletir amplamente sobre a sociedade atual.

Penso que daqui a duas ou três gerações este filme será um bom objeto de análise sobre tendências do comportamento humano nos anos 2000 a 2010. E temos muitos outros objetos de análise que vão confirmar estas tendências.

Por exemplo: atualmente veicula na TV uma propaganda de carro em que uma bela jovem executiva, de trinta e poucos anos, aparentemente bem sucedida, pergunta a um homem, em condições semelhantes, onde ele imagina que vai estar dali a cinco anos. Ele, então, se imagina ao lado dela viajando neste luxuoso carro (o da propaganda) e rebate a pergunta. A moça imagina a mesma situação, mas, desta vez, o rapaz aparece como motorista e não como seu namorado.

O padrão de felicidade e sucesso retratado é o dos jovens, brancos e ricos, que chegaram ao topo da direção de uma empresa. O fato de eles imaginarem o carro em questão dentro de um sonho para um próspero futuro deixa implícita a idéia de que ele deve ser absurdamente caro. Ou seja, a intenção é a de apresentar um carro que só uma pequena elite possa ter. Esta historinha defende que existem aqueles que são privilegiados na sociedade e que isso é natural e é bom.

Esta propaganda me veio à cabeça depois de assistir El Método. Ele é tão cínico quanto. Ele enaltece o mais extremo e cruel individualismo e a forma mais nefasta de ambição. Ele coloca a condição sine qua non de ser frio e calculista para se alcançar o sucesso no ramo empresarial. Claro que, diferente do comercial do carro, o filme faz uma abordagem crítica.

Tudo se passa em Madri. Praticamente todo o filme acontece na sala da multinacional espanhola onde os sete candidatos disputam uma vaga de executivo. Concomitantemente marchas de protestos contra a globalização e a política monetária do FMI passam pela rua do prédio onde ocorre a seleção. É um sutil contraponto ao foco do filme. A manifestação contra a política monetária é o outro lado do processo de seleção em uma multinacional, processo do qual o sistema se alimenta.

Um pretenso método denominado Grönhom é aplicado para seleção. Trata-se de uma forma de analisar as reações dos candidatos em níveis altos de tensão. O grupo é deixado a sós em uma sala, sendo promovidos vários testes via computador que têm por objetivo analisar a interação entre eles. Nos jogos os próprios candidatos se eliminam.

Tal como a propaganda citada, aqui impera a dissimulação. E ela é tão eficaz que chega a criar graça e simpatia mesmo em um esquema de pura discriminação e injustiça social. Afinal, não é novidade que as regras do mercado de trabalho fez com que as pessoas aprendessem a encenar atitudes e situações para garantirem seu lugar.

A primeira prova é a tentativa de descoberta de representante da empresa entre eles. A segunda, a escolha de um líder por unanimidade. A terceira, um voto de confiança no líder escolhido ou a sua eliminação. Na quarta, supõe-se que houve uma guerra nuclear e só há lugar para 5 no bunker, ou seja, um tem que ser eliminado. Numa outra prova, uma disputa entre a Inglaterra, a França e a Espanha. Na prova final, um concorrente deve usar de todos os artifícios possíveis para convencer o outro a desistir.

O filme inteiro se passa na sala onde os personagens são testados e observados. Nos raros momentos em que se muda de local, continuamos dentro dos muros da empresa. É como se lá dentro fechados, eles estivessem quase numa realidade paralela, num outro mundo.

Este filme é baseado na peça de teatro El Método Grönholm. De fato, os recursos simples, o roteiro dinâmico e criativo e a valorização dos diálogos e da interação entre os personagens dão um ar teatral ao filme.

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