Amargo Pesadelo

31 out 2014 . 17:55

 

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Amargo Pesadelo (Deliverance)
EUA, 1972
John Boorman.
Com Jon Voight, Burt Reynolds, Ned Beatty, Ronny Cox, Ed Ramey

Inicialmente pode parecer aventura padrão, mas Boorman transforma o que era belo num verdadeiro desafio pela sobrevivência.


Por Ricardo Flaitt, Alemão

Por mais que o homem reinvente o mundo por meio da tecnologia, a discutível segurança da cidade perde-se quando se tem de sobreviver contra as forças da natureza e dos instintos primevos dos homens.

Em “Amargo Pesadelo”, quatro amigos urbanos de classe média resolvem fazer uma aventura: descer as corredeiras de um rio que, em breve, será represado.

Num primeiro momento, “Amargo Pesadelo” pode até parecer uma aventura padrão daquelas exibidas na Sessão da Tarde, com homens desafiando corredeiras em meio a uma paisagem exuberante.

No entanto, o filme de Boorman não é simplista. Vários elementos transformam o que era belo num verdadeiro desafio pela sobrevivência, com cenas que podem chocar os mais conservadores.

Os quatro personagens condensam várias personalidades contrastantes, que dão um tempero a mais ao filme, uma vez que diante do perigo, cada personalidade reagirá de um modo, cada um fará um julgamento, uma nova escolha e uma consequente sentença.

Lewis (Burt Reynolds) é o valente desbravador; Ed (Jon Vooght) é o sujeito calado, inseguro; Bobby (Ned Beatty) o típico solteirão, gorducho, fanfarrão, animal fora do habitat urbano; e, por fim Drew (Ronny Cox), intelectualizado, repleto de princípios e moralidade.
Ao se depararem com os desafios naturais, começam a sentir que a aventura não será tão simples. Somado à natureza, incluem-se os nativos (caipiras sob o olha do “homem urbano”), que se comportam como de modo que o seu espaço de terra estivesse sendo agredido/invadido pelos suburbanos. Deste modo, não é só a natureza que se revolta contra o homem, mas também se personifica nos moradores da região.

O homem “civilizado” das cidades, arvorado em sua organização do meio, ainda é presa fácil perante as forças das naturezas (do meio e do homem). Como Nietzsche escreveu no livro “Genealogia da Moral”, somos todos animais, temos dentro de nós um instinto para matar, que só não são exteriorizados porque foram criadas as leis. São elas que sufocam nossos desejos mais primitivos.

“Amargo Pesadelo” é um grande filme, mas foi ofuscado e acabou esquecido pelo grande público devido ao sucesso de “O Poderoso Chefão” e “Cabaret”, que levaram praticamente tudo no Oscar daquele ano.

Vale destaque para a cena antológica do duelo de banjos entre o caipira interpretado por Billy Redden e o intelectual Drew.

O título original é “Deliverance”, que significa libertação. O autor do livro, James Dickey, faz uma ponta como o xerife. Para reduzir os custos de produção e dar maior realidade ao filme, os atores foram seus próprios dublês; por exemplo, Jon Voight realmente subiu a encosta. Com o mesmo intuito os habitantes de locais próximos foram escalados nos papéis do pessoal que mora nas colinas.


Ricardo Flaitt (Alemão) é assessor de imprensa do Sindicato dos Metalúrgicos de Piracicaba. Autor do livro “O Domesticador de Silêncios”, lançado pelo Centro de Memória Sindical

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