03 maio 2012 . 10:27
EUA, 2008 Clint Eastwood.
A satisfação de ver um verdadeiro bom filme, e não um filme que quase chega lá, me levou a buscar o que já foi escrito sobre Gran Torino. As análises que encontrei confirmam o talento de Eastwood tanto como ator, quanto como diretor. Mas não entram a fundo no coração da história de Walter Kowalski. Em suas entrelinhas o filme vai além da história de um aposentado rabugento, ex-operário da indústria automotiva e ex-combatente da Guerra da Coréia (1950-53) que, com a recente morte da mulher se vê obrigado a lidar com os orientais, descendentes de Hmong que migraram para os Estados Unidos após a guerra do Vietnã.
Quem leu o romance São Bernardo, de Graciliano Ramos, pode se lembrar da angústia do rude Paulo Honório que, ao fim da vida sente o peso de seu passado. Formado em uma cultura machista, Honório aprendeu a ser “homem” à moda antiga, conforme o atraso cultural lhe ensinou. Seu desgosto se dá por sua inabilidade de lidar com as pessoas e, sobretudo, consigo mesmo, com suas emoções e com seus sentimentos. Embora, do ponto de vista moral, a distancia entre Kowalski e Honório seja grande, foi nas resenhas sobre São Bernardo, que encontrei o fio da meada para pensar em Gran Torino.
Sobre protagonista do filme, o macho provedor, que se vê na condição de lidar consigo mesmo, também pesam as histórias do passado.
A figura de Kowalski, ponto central do enredo, é moldada por uma trajetória de trabalho duro, contínuo e necessário. Seus modos, suas expressão facial, sua postura física, seus ensinamentos, tudo está orientado pela lógica de quem se formou na vida através do trabalho. Desta forma Gran Torino trata da vida e da subjetividade de um trabalhador.
Diferente de Paulo Honório, Walter Kowalski busca seu próprio resgate. Esta oportunidade se dá quando o adolescente Thao (Bee Vang), descendente de Hmong, vizinho de Walt, passa ser assediado por uma gangue. A família que vive ao lado de Kowalski não tem proteção alguma contra o assédio da gangue. Os rituais de iniciação e de integração mostram o universo da masculinidade rude e simplória. Escolado nos embates de gangue e de guerra, Walt toma as dores do menino Thao. Nasce daí uma inusitada amizade. Nesta virada está a grandiosidade do filme. A máscara de pistoleiro implacável de Clint Eastwood é desconstruída dando lugar a uma feição solidária e humana.
Surge aí outra importante mensagem subliminar do filme. A de que o homem se salva quando vence seus preconceitos, abre-se à diversidade étnica, cultural, social etc, e passa a contar com o outro para dar sentido a si mesmo.
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